RECEITA DE ANJO

UM ANJO CHEIO DE REUMATISMO

 

Não, você não precisa esperar pelo Céu para fazer com que lhe cresçam asas de anjo – aliás, no Céu, para onde podem levá-lo, elas não mais terão nenhuma serventia, pois não haverá mais para onde voar além…

O momento de fazer com que as suas asas de anjo comecem a crescer é agora – para sair desse “vale de lágrimas”, que é a Terra, você necessitará delas, já que, de outra maneira, você não conseguirá escalar as escarpas tão escorregadias do escuro abismo em que se encontra arrojado…

Comece, portanto, a cuidar para que, pelo menos, algumas penuginhas delas lhe apareçam – penuginhas luminosas que, preferencialmente, despontam das feridas que possam ser provocadas pelo peso da cruz que você prossegue ombreando…

– A cruz, que tem o formato de uma enxada, ao cavar fundo em seus ombros, faz nascerem asas de anjo! –

Se me permite, vou tomar a liberdade de lhe passar uma receita de “asas de anjo”, que, há muito tempo atrás, me foi dada por uma senhora, que andava pela Terra apoiada a uma bengala – eu jamais suspeitei que, por vezes, um anjo pudesse tomar a forma de uma velhinha carregada de reumatismo – mas pode, pode sim!…

Ela, ou ele, o anjo, que manquitolava, como se me passasse uma receita, pôs-se a me falar:

– Meu filho, se você quiser ser anjo, sem, para tanto, necessitar ir para o Céu, atenda, desde agora, aos seus pequeninos deveres na Terra.

Não fale mal de ninguém.

Faça todo bem que puder.

Não dê ouvidos à maledicência.

Tenha zelo pelos animais.

Cultiva flores – muitas flores.

Ore pelos que lhe perseguem e caluniam.

Exercita a humildade.

Perdoa sempre, sabendo que não guardar mágoa no coração é melhor do que guardar, porque perdoar, de fato, dá muito trabalho.

Não queira ser maior que os outros, pois a verdadeira grandeza está na pequeneza.

A tarefa que ninguém quiser cumprir será sempre aquela que você escolherá para cumprir – a última, a mais obscura, mais penosa e sem reconhecimento e aplauso de quem seja!

E acrescentou sorridente: – A vassoura não é instrumento de voo só para as “bruxas”, não! Valendo-se de uma vassoura, muita gente pode voar da Terra ao Céu!…

Vá varrer o chão, meu filho, sem se esquecer de que, segundo Jesus, foi varrendo o chão que, um dia, uma pobre mulher encontrou a dracma perdida – pequenina moeda que Ele, o nosso Divino Mestre, comparou ao Reino de Deus!

Não se preocupe com os grandes feitos, não, porque os grandes feitos se tornaram grandes a partir daqueles que fizeram com grandeza tudo o que antes era pequeno.

E vou lhe dizer: até que, sem querer, comecem a voar, os anjos não sabem que têm asas! E se elas se fazem invisíveis aos seus próprios portadores, imagine aos demais?! – àqueles que – coitados! – não sabem que foram criados para voar como os pássaros, e não para se arrastarem como os vermes na terra…

Amar é importante – acrescentou. – Não queira ter asas antes disso, porque o Diabo também voa, meu filho! A diferença é que o Diabo voa para baixo, e o anjo voa para cima!…

Vocês devem – curiosos que são – estar querendo saber o nome dessa senhora angelical, que, como alguém que passa uma receita de bolo, passou-me uma receita para ser anjo?! O nome dela não significará muito para vocês, mas vou lhes dizer que ela era minha avó – um anjo cheio de reumatismo e com uma bengala!…

 

INÁCIO FERREIRA

 

Uberaba – MG, 12 de outubro de 2015.

 

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