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MEDIUNIDADE E DESCRENÇA
“O espírito desencarnado ao dirigir-se ao espírito encarnado do médium, não lhe/ala nem em francês, nem em inglês, mas na língua universal, que é a do pensamento; para traduzir suas ideias na linguagem articulada, transmissível, ele tira suas palavras do vocabulário do médium.” (Cap. XIX – Papel do médium nas comunicações espíritas, item 15) O médium deve dispensar os espíritos, que por ele se comunicam, de lhe dar uma prova pessoal da imortalidade. A questão da sobrevivência da alma, após a morte do corpo, carece de ser previamente solucionada por ele, sob pena de transformar-se o próprio medianeiro no maior obstáculo ao intercâmbio legítimo entre as Duas Esferas. A princípio, os espíritos não entram em contato com os encarnados tendo o propósito de convencê-los acerca das realidades da Vida Espiritual, mesmo porque crer ou não crer é pertinente a cada um. Os desencarnados, em seus comunicados de além-túmulo, por mais convincentes sejam, apenas fornecem subsídios para a crença, que, em última análise, é conquista individual e intransferível. A certeza de que um médium possua da Vida, após a morte, se traduz em suas atitudes no cotidiano – ela se reflete em seu modo de viver. Assim, que o medianeiro, seja qual for a sua faculdade, se limite ao cumprimento do dever a que é chamado, procurando não extrapolar em suas atribuições. Pregando em Nazaré, cidade em que crescera, diz-nos Mateus, no capítulo 13, versículo 58, de suas anotações, que Jesus “não fez ali muito milagres, por causa da incredulidade deles.”
Ora, está claro: Jesus não fez muitos milagres em Nazaré, mas os fez, e, mesmo assim, não logrou a adesão da maioria… Testemunhando os prodígios que eram feitos aos seus olhos, por se suporem iludidos, eles não acreditavam! Marcos, no Evangelho de sua autoria, capítulo 3, versículo 21, afirma categórico: “E quando os parentes de Jesus ouviram isto, saíram para o prender, porque diziam: Está fora de si”. O Cristo, que era o Cristo, sequer logrou, à exceção de sua Mãe, convencer os próprios familiares! Os fenômenos das mesas girantes, que empolgaram toda a Europa e a América do Norte, resultando na Codificação Espírita, não foram capazes de subtrair ao comodismo milhares de indiferentes que os puderam presenciar à saciedade. Durante três anos consecutivos, Sir William Crookes, um dos físicos mais destacados do século XIX, realizou experiências com a médium adolescente Florence Eliza Cook, observando as frequentes materiazações de Katie King, enviando extenso relatório sobre a autenticidade do fenômeno à Royai Society, de Londres, que simplesmente o arquivou, dando o caso por encerrado. Que o médium, portanto, no anseio, por vezes justo, de ser instrumento de crença na imortalidade aos cépticos, não corra o risco de ridicularizar a própria fé. A crença na sobrevivência da alma está afeta à maturidade do senso moral e não apenas ao intelecto. Que cada medianeiro se limite a ser o médium que é, convicto de que, no cumprimento regular do dever que lhe cabe, no exercício de suas modestas faculdades, ele estará fazendo a parte que lhe compete pela vitória do Ideal. Sobretudo, conscientizemo-nos de que, se a mediunidade consegue sobreviver à dúvida dos que, não raro, dela escarnecem publicamente, sempre sucumbe à fragilidade espiritual de seu portador. De maneira geral, os médiuns, na presente experiência reencarnatória, lidando com as suas faculdades incipientes, estão trabalhando na construção da fé em si mesmos, para, depois – e somente depois -, se transfigurarem em elementos de crença para os semelhantes.
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